Entrevista – Diário Insular, 01 de Junho de 2011
1 – A Santa Casa da Misericórdia de Angra do Heroísmo está a desenvolver acções de sensibilização para o voluntariado junto da juventude. A equipa de formadores tem detectado espaço no interior dos nossos jovens para esse tipo de actividade?
Estas acções de sensibilização acontecem no âmbito do programa para o AEV-2011 da Santa Casa da Misericórdia de Angra do Heroísmo tendo já abrangido cerca de 200 alunos, desde o ensino pré-escolar até ao ensino secundário. No segundo semestre deste ano decorrerão duas acções junto da população universitária.
A avaliação é francamente positiva, como evidenciam vários indicadores: o nível de adesão dos jovens durante as acções, as manifestações de interesse e participação durante as mesmas, os projectos de escola no âmbito do voluntariado e ainda a procura, por parte dos jovens, após as acções, de informação adicional. Neste momento temos mesmo cerca de dez pedidos de admissão de jovens para trabalho voluntário, os quais aconteceram na sequência das referidas acções. Isto leva-nos a concluir que o espaço existe e que os jovens são capazes de fazer um excelente trabalho voluntário, quando devidamente informados e motivados.
2 – A Europa está a lançar campanhas para o trabalho voluntário, o que significa que se entende que esse sector ligado à solidariedade já terá conhecido melhores dias ou então que a necessidade nas sociedades é imensa. Tem notado alguma retracção no trabalho voluntário e solidário na nossa sociedade?
O voluntariado existe desde sempre. Existem muitos voluntários que exercem trabalho voluntário de forma espontânea e não organizada. Segundo a lei em vigor no nosso país, o voluntário deverá estar vinculado, através de contrato programa de voluntariado a uma entidade promotora. A existência desse conjunto de campanhas, programas, concursos e prémios diversos que a União Europeia apresenta no âmbito deste ano europeu significa que se entende que a necessidade do trabalho voluntário é imensa nas sociedades actuais. A meta é passar dos actuais 94 milhões de voluntários existentes neste momento no espaço europeu para os 200 milhões no fim deste ano. Desde há alguns anos a esta parte tem sido bastante visível no plano internacional e nacional a imensidão de projectos e de iniciativas que traduzem a capacidade de organização dos cidadãos e das instituições para, com recurso a trabalho voluntário, darem respostas às mais variadas necessidades. Acredita-se, no entanto, que muito mais e melhor poderá ser feito pelos voluntários em prol de um mundo melhor.
3 – Nos meios ligados à solidariedade e ao apoio aos mais desfavorecidos e carenciados, como está a ser sentido o impacto da crise que estamos a atravessar? Os estragos sociais são já evidentes entre nós? Como se caracterizam?
A crise que estamos a atravessar traduz-se em indicadores que são dramáticos para alguns segmentos da população. Com efeito, os momentos de crise são particularmente nefastos, regra geral, para todos aqueles cuja situação já era de alguma fragilidade. Esta crise, no que diz respeito aos meios ligados à solidariedade social tem-se traduzido num avolumar dos pedidos de refeições, roupas e outros bens de primeira necessidade, internamentos para idosos em situação de manifesta carência,…
Entre nós começa a ser preocupante a situação do desemprego em determinados sectores de actividade de indivíduos pouco qualificados e, portanto, com dificuldades de voltar a entrar e permanecer no mercado de trabalho. Constatamos também o crescente desemprego entre os licenciados, que acabam por procurar trabalho voluntário como forma de ocupação útil do seu tempo.
4 – É sensível ao ditado popular “De graça trabalha o caruncho e só dá prejuízo”? Parece-lhe que este provérbio pode ter alguma aplicação no trabalho solidário?
O trabalho voluntário é exigente, ao contrário do que se possa pensar. Deve ser feito de livre vontade, no tempo disponível, gratuitamente mas com sentido de compromisso e de responsabilidade. E com ele o voluntário ganha, afinal, muito. Não ganha dinheiro. Mas ganha realização pessoal, auto-estima, uma nova mundivisão, sensibilidade aos problemas dos outros, capacidade de relação, um capital social muitas vezes útil noutros contextos da sua vida. Aprende novas competências e ocupa o tempo de uma forma útil em nome de uma causa que faz também sua. O voluntariado torna-nos, afinal, melhores cidadãos e é toda a comunidade que se torna mais forte, mais robusta e mais humana. Por isso, sejamos voluntários. Façamos a diferença porque vamos ser mais felizes e os outros também!
Maria Manuela Sousa