Em tempos em que todos se desculpam porque não há tempo para nada nem ninguém, haverá mil e uma razões para não se conseguir cuidar, amar, apoiar o nosso idoso que inicia o seu processo de senescência e senilidade. Mas, afinal onde residem as nossas prioridades? Aquele que cuidou de tudo e de todos, necessita agora ser cuidado! Infelizmente, a sociedade e famílias da actualidade não têm conseguido prestar um apoio tão premente como este – culpa de todos, culpa de ninguém!
Recorre-se então ao apoio formal que, muitas vezes, funciona como uma primeira resposta e não como um último recurso. Na verdade, em alguns casos, é um mal necessário! Este apoio que pretende ser sinónimo de expectativa de vida, nem sempre é encarado pelos seus protagonistas como tal, motivado por: dependências crescentes, doenças crónicas, perdas (físicas, emocionais, …), sentimentos de solidão, inutilidade, vazio, despersonalização, entre outros. Estes serão alguns dos motivos que despoletam o recurso à consulta de psicologia. Aqui, abre-se espaço à expressão de sentimentos e emoções, escondidos ou expressos no rosto e no corpo de quem sofre estas vivências; abre espaço ao conto de narrativas, todas elas diferentes, contadas e vividas por pessoas diferentes, reflectindo vidas repletas de histórias de amor, marcadas por encontros, desencontros, experiências positivas e outras negativas, todas elas com um significado pessoal inigualável. Contudo, parece existir um denominador comum em todas estas narrativas – sofrimento emocional -, que necessita ser validado e reconhecido por alguém. Tal como a letra e música de Mafalda Veiga, em “Um pouco de céu” - Não quero levar o que dei/ Talvez nem sequer o que é meu/É que hoje parece bastar/Um pouco de céu/Um pouco de céu - talvez, em consulta de psicologia, através de um olhar atento e tranquilo do profissional, este um pouco de céu seja “tocado” pela pessoa idosa, através da disponibilidade afectiva e temporal que lhe é concedida, onde a pessoa vê reconhecida e reforçada a sua identidade.
A consulta de psicologia pretende orquestrar emoções e sentimentos que necessitam ser afinados, em ordem à manutenção do respeito e da dignidade que qualquer ser humano deve preservar, seja qual for a circunstância, especialmente, na situação de pessoas idosas fragilizadas emocionalmente, para que nunca se esqueçam da sua identidade e para que se reconheçam sempre como ALGUÉM!
Dra. Sabina Romão
Psicóloga no Lar de Idosos da Santa Casa da Misericórdia de Angra do Heroísmo.
(Artigo publicado no jornal voz das Misericódias)